Os efeitos da pandemia no preço dos alimentos

A pandemia, aliada à crise econômica, evidencia a importância de produção local de alimentos

Uma pandemia mundial, algo que não ocorre há mais de 100 anos, é, sem dúvida, o fato do ano, a história das próximas décadas. Os analistas certamente levarão algum tempo até que se sintam confortáveis em apontar os impactos e os efeitos na economia e nos mercados no pós pandemia.

Os grãos fazem parte da alimentação desde os tempos bíblicos, com várias citações: ”oferecerás como oferta de alimentos das tuas primícias de espigas verdes, tostadas ao fogo; isto é, do grão trilhado de espigas verdes cheias” (Levítico 2:14). Na atualidade, direta ou indiretamente, os grãos compõem boa parte da alimentação humana. 

Durante a colheita da safra de verão teve início a pandemia da Covid-19. No primeiro momento, a reação do mercado de grãos foi negativa. A economia mundial estava em declínio, com o consumo de grãos, por consequência, sendo impactado por esta queda na economia mundial. No entanto, houve uma reversão no mercado de grãos, um comportamento atípico dos principais produtos.

Em abril, um mês após o início da pandemia,  o milho sofre pressão baixista no mercado externo, devido à forte queda do preço do petróleo, o que reduziu a competitividade do etanol produzido nos Estados Unidos e no Brasil. O cenário do cereal no mercado interno também não era positivo, uma vez que a segunda safra não era afetada significativamente pelos efeitos climáticos. 

Mas, com a maior demanda pelos produtores de proteína animal e as expectativas das exportações no segundo semestre, ocorreu um fato inédito: a alta nos preços internos do cereal em plena colheita da segunda, e maior, safra no Brasil. Os preços batem recordes em vários momentos, nos portos e no mercado interno. 

soja tem as exportações aquecidas para a China no primeiro semestre e a tendência de alta diante da valorização do dólar segue.  Estes fatores, aliados à maior demanda no mercado interno para o setor de carnes e biocombustível, levam a soja a registrar recordes de preços. Outro fator incomum passa a ser registrado: o estabelecimento de contratos para a compra de commodities da safra 2021/22.

O trigo acumula fortes altas globais, que estão sendo repassadas aos preços domésticos, também alavancados pela demanda interna aquecida. Com mais tempo permanecendo em casa, as pessoas estão produzindo pães para consumo familiar.

Nem a dupla arroz e feijão escapou, se valorizando com a demanda aquecida desde o início da pandemia, com os consumidores formando estoques diante do risco de desabastecimento. Além da demanda, outros fatores contribuíram para a instabilidade nos preços. A redução da área de cultivo de produtos básicos em favor da soja está concentrando a produção e reduzindo oferta. Com os preços atuais da soja, este cenário tende a se agravar nos próximos anos. As exportações brasileiras de arroz, com os volumes mais significativos no ano, também contribuíram para redução de oferta do produto no mercado interno. Assim, o arroz tem preços inéditos. O feijão, também com o consumo mais elevado no primeiro semestre, apresenta maior sensibilidade de mercado. A diminuição da área de cultivo nos últimos anos também foi muito significativa, com redução  de mais 40% desde 2000. A manutenção do consumo no Brasil pode gerar problemas de abastecimento e levar à necessidade de importações recordes no ano.

Demanda internacional

Assim, o mercado internacional apresenta uma forte demanda para os diferentes grãos. Vários fatores justificam esta demanda, entre eles o câmbio e o mercado interno, mas o principal é o temor pela falta de abastecimento dos países que dependem das importações para o suprimento de alimentos. A segurança alimentar foi o mote do impulso do mercado de grãos em 2020.

Há uma conjuntura de alta das commodities agrícolas, incluindo o mercado de carnes, leite e derivados. No mundo das commodities agrícolas, as incerteza levam a uma forte volatilidade. No primeiro momento da pandemia, os preços da energia e do leite caíram drasticamente, para em seguida atingirem novas máximas históricas. Os preços do arroz, também, estão alcançando patamares históricos.

Estes são apenas três exemplos, de muitos, de mercados que experimentaram movimentos extremos de preços em um pequeno intervalo de tempo. A crise desencadeada pela Covid-19 fez com que os números da desnutrição no mundo fossem revisados em função da elevação dos preços dos alimentos. Embora o Brasil esteja relativamente mais protegido do que os países importadores, o direcionamento da produção para a exportação, atrelada à imensa desigualdade regional e de renda, nos leva a ponderar se este cenário poderá levar a população brasileira a uma situação de vulnerabilidade, exposta à insegurança alimentar.

A forte demanda internacional por grãos, cereais e carnes reflete o posicionamento de países importadores, no sentido de garantir a segurança alimentar de suas populações. No Brasil, o efeito do fortalecimento da demanda internacional, junto com a desvalorização cambial recente e o aumento do consumo de alimentos nos domicílios, influenciaram na alta dos preços dos alimentos. A pandemia provocada pela Covid-19, aliada à crise econômica que a precede, evidencia a importância da disponibilidade de produção local de alimentos, de forma mais distribuída, como forma de diminuir os impactos do mercado internacional nos preços locais dos alimentos. Os pequenos produtores, ao serem tomadores de preço e não influenciarem individualmente os preços locais, diminuem a variação/volatilidade de preços, o que colabora com a segurança alimentar da população onde se insere.

Haroldo Tavares Elias, analista do Centro de Socioeconomia e Planejamento Agrícola da Epagri (Epagri/Cepa)

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Esta notícia foi autorizada para publicação.

Créditos: Gisele Dias – Assessoria de Comunicação da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (EPAGRI)

Sistema de produção limpa de alimentos da Epagri é premiado pela FGV

A Epagri será premiada pela Fundação Getúlio Vargas por ter desenvolvido um sistema de produção limpa de alimentos. O Sistema de Plantio Direto de Hortaliças (SPDH) foi um dos 12 casos selecionados no Brasil, na área de inovação para a inclusão da agricultura familiar em cadeias de alimentos. A entrega do prêmio aconteceu nesta quinta-feira, 12 de setembro, em São Paulo, no Centro de Estudos em Sustentabilidade (FGVces) da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV/EAESP.

                   SPDH sistema de produção limpa de alimentos. Foto: Marcelo Zanella

A premiação é realizada por meio do Projeto Bota na Mesa, da FGVces, com o tema Mudança do Clima e Transição Agroecológica. O caso da Epagri foi selecionado entre outros 80 inscritos por instituições públicas e privadas do País.

O objetivo da premiação é inspirar a construção de referências de atuação para empresas e governos em relação à cadeia produtiva de alimentos. Para selecionar os casos, pesquisadores do FGVces levaram em consideração o grau de inovação, a conexão com os temas de transição agroecológica e mudança do clima, a contribuição para a inclusão da agricultura familiar e o potencial de escala e replicabilidade de cada iniciativa.

                   SPDH sistema de produção limpa de alimentos. Foto: Marcelo Zanella

 

SPDH

O Sistema de Plantio Direto de Hortaliças vem sendo desenvolvido há 25 anos em Santa Catarina. Ele consiste em alguns princípios fundamentais que, se forem aplicados corretamente, levam a reduzir ou até eliminar o uso de produtos químicos nas propriedades, no curto ou médio prazo, explica Marcelo Zanella, extensionista rural da Epagri na Grande Florianópolis e especialista no assunto. Entre esses princípios estão o uso plantas de cobertura para proteger o solo, a rotação de culturas, a nutrição adequada da planta segundo suas taxas diárias de absorção, o não revolvimento do solo e o manejo mecânico das plantas espontâneas sem produtos químicos.

                  SPDH sistema de produção limpa de alimentos. Foto: Marcelo Zanella

Existem atualmente em Santa Catarina entre 1,2 mil e 1,3 mil propriedades trabalhando em SPDH, que abrangem uma área de 3,5 mil a 4 mil hectares. As principais lavouras de SPDH no Estado são maracujá, couve, repolho e brócolis. Na Grande Florianópolis, praticante todo o chuchu é cultivado no sistema. A área cultivada com alface e tomate também vem crescendo muito no Estado.

“A gente chama de plantio direto propriedades que estão em transição para o sistema de produção limpa. Algumas estão mais adiantadas, outras mais atrasadas, mas todas estão num processo de adequação“, descreve o extensionista da Epagri. Santa Catarina é pioneira nesse sistema no país, que surgiu da necessidade de diminuir custos e elevar a competitividade da agricultura familiar. “A ideia é reduzir o trabalho do produtor e aumentar a qualidade dos alimentos”, explica Marcelo.

                            SPDH sistema de produção limpa de alimentos. Foto: Marcelo Zanella

 

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Esta notícia foi autorizada para publicação.

Créditos: Gisele Dias – Assessoria de Comunicação da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina (EPAGRI).