A charrete para em frente à casa, e o leiteiro grita: “- Olha o leite!”
Colunista: Romário Santana
Agricultor, Professor e Mestrando em Estudos Rurais (UFVJM), romario.santana@ufvjm.edu.br
A coluna “Como diz o otô”, traz uma abordagem histórica sobre a produção do leite antigamente até os dias atuais. O título “Leite é bom: pinga pouco, mas pinga todo dia” reflete o sentimento dos produtores em relação à produção do leite.
Houve um tempo em que se criavam poucas vacas e o leite dava apenas para a despesa da casa. Contudo, os tempos mudaram, as famílias rurais passaram a ter muitas vacas, tiravam muito leite a pasto e utilizavam as “paiadas” das roças no período da seca. Durante a seca também, cortavam e moíam cana ou capim para tratar do gado. O leite era levado à cidade de charrete, transportado em braúnas, sendo entregue de casa em casa, sempre anunciado pelo leiteiro: “Olha o leite!”. O pagamento ao leiteiro era feito mensalmente e ele anotava tudo numa caderneta que ficava guardada na gaveta da charrete. Dias a fio, o leiteiro fazia o mesmo percurso “fizesse chuva ou sol”. Os “cavalos de carroça” eram revezados ao longo da semana para que nenhum se cansasse mais que o outro, pois, na maioria das vezes, os percursos da roça até a cidade eram longos. As vacas eram apartadas (separadas dos bezerros) ao longo do dia. A lida era sempre de madrugada, com muito frio e orvalho. Para aquecer do frio, nada melhor do que tomar um copo de leite mungido com açúcar e café. Havia também os que gostavam de tomar espuma de leite com café. Aí, era só levantar a coadeira da braúna e com um copo limpo retirar a espuma, colocar o café e beber. A leiteira ou a panela para colocar o “leite para despesa” ou o “leite para dentro” ficava sempre em cima do jirau ao lado das braúnas.
O tempo foi passando… E as charretes foram substituídas…Muitas delas por caminhonetes de carroceria, que faziam as linhas recolhendo o leite, que depois seria vendido na cidade. As carrocerias dos leiteiros, além de andarem lotadas de braúnas com leite, também transportavam gente, pois nessa época, o leiteiro era o principal meio de transporte até a cidade. Os leiteiros compravam leite dos produtores e vendiam na cidade. Entregavam de porta a porta. O valor pago na época era em centavos. Enfrentavam muitas dificuldades, entre elas, estradas ruins e muitos atoleiros no período das chuvas, que caiam até formar lodo nas estradas. Saudades desse tempo!
Foto: Romério Santana
Mas o tempo foi passando, e as coisas mudaram… as tecnologias chegaram ao campo. A quantidade de vacas aumentou. Hoje em dia, as vacas não são mais apartadas dos bezerros. Os bezerros são retirados quando nascem e são criados à mamadeira, abrigando-se em um lugar chamado bezerreiro. O leite, que antes era tirado à mão, deu lugar à ordenha mecânica, que faz todo o trabalho praticamente sozinha. O bezerro, que era utilizado para apojar a vaca, foi trocado pela ocitocina, que é aplicada todos os dias quando as vacas entram na sala de ordenha. As vacas ainda fazem uso da pastagem, mas se alimentam também com silagem e ração balanceada, que ajuda aumentar o leite. As roças são plantadas com o objetivo de fazer silagem, para tratar do gado durante o período de seca. Atualmente, o leite é armazenado na propriedade, em um “tanque de leite” e não mais em braúnas. Fica armazenado até o leiteiro (que hoje em dia não é mais uma caminhonete de carroceria, mas um caminhão tanque) vir buscá-lo. Quase não se toma mais leite mungido. O leite não é entregue diretamente ao consumidor, e sim à uma cooperativa, que o processa e vende os produtos, entre eles o “leite de caixinha”. E, acredite se quiser, há muita gente que pensa que a caixinha é quem dá leite!
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